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Bebê Rena: Quando os meninos não choram

Sobre traumas e sombras que nos acompanham.

Divulgação/NETFLIX

Vamos falar sobre a série "Bebê Rena", e como os traumas estão sempre presentes, como sombras que nos acompanham ao longo da vida. Essas experiências dolorosas muitas vezes permanecem guardadas profundamente dentro de nós.

Essas lembranças devastadoras não desaparecem facilmente. Os sobreviventes muitas vezes sentem vergonha dos abusos que sofreram em algum momento de suas vidas. A série da Netflix é inspirada em uma história real de abuso sexual e perseguição.

Criada, produzida e estrelada pelo comediante escocês Richard Gadd, a história inicialmente foi adaptada para o teatro como um monólogo em 2019. Traduzido do inglês, "baby reindeer", o título da série faz alusão ao apelido carinhoso dado ao personagem principal, Donny, por uma mulher que se torna sua perseguidora, Martha.

Tudo começa quando Donny, trabalhando como barman, serve uma xícara de chá para uma mulher aparentemente solitária chamada, Martha. Ela se apega a Donny, desencadeando uma perseguição obsessiva por ele. Martha o apelida carinhosamente de "Bebê Rena", embora não seja totalmente claro o motivo desse apelido.

Em uma das mensagens deixadas para Donny, Martha revela ter sofrido abusos na infância e uma vida caótica. Nos momentos difíceis, ela encontrava conforto em uma rena de brinquedo, que guardava com carinho.

Donny sofre abuso sexual, é estuprado por um homem quem considerava amigo, em uma dos episódios.

Trazendo uma história paralela e autodepreciativa sobre Donny batalhando como comediante em um festival de Edimburgo, na Escócia, somos apresentados a Darrien, interpretado por Tom Goodman Hill, um escritor da indústria de televisão que oferece ajuda a Donny para chegar aos escalões mais altos do mundo da comédia.

Em vez de oferecer apoio, Darrien encoraja o uso de diversas drogas. Enquanto Donny está inconsciente em seu apartamento, Darrien o agride sexualmente pela primeira vez. Em outra cena chocante, Donny é estuprado por Darrien. O poder que Darrien exerce sobre Donny é tão avassalador que este se sente incapaz de escapar.

Mais uma vez, esta história vem da própria vida de Gadd: em seu espetáculo teatral de 2016 Monkey See, Monkey Do ("Macaco Vê, Macaco Faz"), ele detalhou como foi estuprado por um homem que conheceu em uma festa.

Após seu lançamento em 11 de abril, a série rapidamente conquistou o topo das listas de mais vistas da Netflix nos EUA, no Reino Unido e, mais recentemente, no Brasil, acumulando mais de 10,4 milhões de horas assistidas até o momento. No início, pode-se pensar que se trata de uma série de terror, porém, à medida que a trama se desenrola, ela penetra na mente do espectador como uma adaga afiada, atingindo o cerne emocional.

A narrativa é brutal e sufocante, transportando o espectador para a perspectiva de Donny, incapaz de fugir ou pedir ajuda. A série mergulha em gatilhos profundos, tocando feridas de quem já enfrentou abusos, perseguições ou qualquer forma de violência.

Não se trata de uma cura coletiva, não creio nisso. É mais como uma ventania que ergue toda a poeira, e essa poeira entra nos olhos. Então você se vê diante do espelho do banheiro, lava seus olhos cheios de poeira, e encara aquilo que guardava dentro de si, aquilo que nunca quis que ninguém soubesse, pensando que já havia superado. No entanto, ali está, diante de você.

A caminhada de Donny oferece uma perspectiva profunda sobre o consentimento, a vitimização e as pressões sociais impostas aos homens para que se conformem com as normas tradicionais de masculinidade, que frequentemente moldam suas reações ao abuso.

É como uma árvore repleta de abacates, com frutos maduros que caem no chão de tão maduros, e você se vê obrigado a recolhê-los para não deixar o chão sujo. Há múltiplas metáforas e camadas de significado.

Em uma sociedade profundamente machista, a pressão desde a infância para que os meninos sejam fortes e competitivos faz com que aqueles mais sensíveis sejam alvos de bullying. A série expõe essa ferida de maneira penetrante.

É como se cada cena tocasse em pontos sensíveis, como quando um pai diz ao filho homem: "Menino não chora!"

A pressão constante para que os homens se mostrem fortes e corajosos o tempo todo é um tema recorrente na série. É interessante notar que, muitas vezes, são as mulheres que exercem essa pressão.

O personagem se vê confrontado com piadas sexuais por parte de seus colegas, relacionadas à sua convivência com Martha, que frequentemente o visita no bar onde trabalha, para conversar com ele.

Martha, o nome dado por Gadd à personagem stalker, interpretada por Jessica Gunning , é o arquétipo de uma mulher malévola, ela inferniza a vida dele, em sua vida virtual e real, perseguindo-o até quando está no palco, se apresentando ao lado de sua colega, atacando violentamente sua parceira Teri, Nava Mau, e depois o ataca quando está na rua, a noite, voltando para casa.

Martha não é retratada como uma mulher vingativa, pelo contrário, sua personagem é complexa, revelando diversas camadas que apontam para alguém que está em necessidade de apoio, lidando com questões relacionadas à saúde mental.

Gaad foi corajoso e muito honesto em compartilhar suas experiências tão devastadoras.

Os homens não são super heróis, e não precisam serem fortes e destemidos o tempo inteiro, são falhos, são humanos, e não são obrigados a vestir a capa da invisibilidade, quando passam por violências sexuais, ou quando fracassam.

O mundo mudou muito, em relação a educação dos meninos, muito embora ainda existam cicatrizes que não curam.

Bebê Rena é um um soco no estômago, muito difícil de assistir, mas, necessário .


Reprodução/NETFLIX (2024)


Sobre o Autor:
Mário

Atriz, Performer, Dramaturga e Roteirista. Estudou interpretação Teatral(Unirio). Graduada em Produção Audiovisual(ESAMC). Apenas uma Artista que vende sonhos em dias cinzentos. E quando os dias não forem tão trevosos, ainda assim continuarei a vender meus sonhos!! Cores, abraços, afetos, lua em aquário...

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